segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Mensagens e poemas  
Homenagem para netosSiria Wagner Silva da Silveira

Hoje refletindo sobre a vida e a vinda dos meus netos compreendi que viver paralelamente a vida deles é uma aventura maravilhosa.
A espera de vocês foi um tempo de gestação para mim e de todos nós da família.
Ver vocês nascer foi divino.
Ver vocês crescendo é uma aventura de todos.
Essa aventura é cheia de pequenas batalhas com vitórias e derrotas; para nossa alegria derrotas de muitos males, e vitórias com conquistas, para a nossa felicidade.
Dizem que ser avó é ser mãe duas vezes.
É verdade, pois o amor pelos netos é tão grande que se iguala ao de uma mãe, porém mais forte e mais experiente, mais purificado, mais sábio.
Este amor traz a delicadeza da mais pura sabedoria divina, que só Nossa Senhora teve por ser mãe de Cristo.
Netos são anjos, que tocam em nossos ouvidos uma música tão divina quanto a palavra MAMÃE.
Netos são também a esperança de uma velhice mais tranqüila, pois eles estarão em nossa frente nos acenando com sua juventude e nos encorajando a não nos entregarmos ao acaso que a vida nos reserva.
Neto é a luz mais moderna na criação de Deus.
Neto é a realização completa de um sonho de continuidade da geração da humanidade.
É a bênção de premiação, pela segunda vez, por nosso Criador, Deus Pai.
QUE DEUS OS ABENÇOE SEMPRE, MEUS QUERIDOS NETOS!



 


quarta-feira, 6 de abril de 2011

'SEM PALAVRAS"


[%E0%20espera[1].jpg]

O dia mais belo?
Hoje.

A coisa mais fácil?
Errar.

O maior obstáculo?
O medo.

O maior erro?
O abandono.

A raiz de todos os males?
O egoísmo.

A distração mais bela?
O trabalho.

A pior derrota?
O desânimo.

Os melhores professores?
As crianças.

A primeira necessidade?
Comunicar-se.

O que mais lhe faz feliz?
Ser útil aos outros.

O maior mistério?
A morte

O pior defeito?
O mau humor.

A pessoa mais perigosa?
A mentirosa.

O pior sentimento?
O rancor.

O presente mais belo?
O perdão!

O mais imprescindível?
O lar.

A rota mais rápida?
O caminho certo.

A sensação mais agradável?
A paz interior.

A proteção efetiva?
O sorriso.

O melhor remédio?
O otimismo.

A força mais potente do mundo?
A fé.

As pessoas mais necessárias?
Os pais.

A mais bela de todas as coisas?
O amor.
“A vida sem amor… não tem sentido…”

quarta-feira, 23 de março de 2011

OBRIGADO DE CORAÇÃO, AMIGO IRMÃO BETO RAMOS - DIZ A LENDA

Eu vi o trem partir diante dos meus olhos fechados. Era um sonho com um piui de saudade.

Vem a Máquina 18 sem pressa de chegar.

Trazendo menino buchudo, mulher buchuda, homem buchudo e o filho do Buchudo, com um saco de farinha para comer com peixe frito lá no triângulo.

Partiu a Máquina 18, consegui avistar com os meus olhos de esperança que o maquinista era o Zé Áureo.

Menino criado em terreiro sem muro e com algumas cercas.

Então ele estende a mão e convida a nossa gente, para partir no sonho de todos nós.

E saio correndo atrás do apito do trem.

Corro mais.

Fico cansado.

O Áureo com a mão estendida.

Os meus olhos continuam fechados.

Assim como os olhos de alguns.

O trem então passa devagarzinho para que todos possam ouvir a batida de um surdo de marcação.

Piui tum tum, piui tum tum.

Parece um samba dos tempos áureos de nossa música.

Eu vi o trem passar.

Zé Áureo, vamos convidar todas as pessoas que os nossos sonhos possam alcançar, para conhecerem o que é bom.

Bom mesmo é amar Porto Velho.

A Máquina 18 é o elo de união de todos nós.

Piui tum tum, piui tum tum.

Assim como os sonhos o samba não pode parar.

A Máquina 18 vai partir novamente.

Vamos minha gente ela fica dentro do nosso coração.

Áureo isto não é sonho, é realidade.

Ainda estou correndo atrás do apito do trem.

O bom é que não estou sozinho.

Os meus olhos são os olhos da alma.

Eles passam pelo coração.

Juntam-se com a amizade.

E saem todos para passear na Máquina 18.


Diz a lenda

segunda-feira, 21 de março de 2011

Pensamento do Dia

Eu não me incomodo de ir para o trabalho todos os dias, mas estas oito horas de espera até ir para casa são um saco!

E SEU TIME FOSSE UMA BANDA MUSICAL???

[corintia.jpg]
Corinthians = Michael Jackson
Um dos mais populares da história, envolveu-se em escândalos e até mudou de cor.Têm apostado em criancinhas como Lulinha e Dentinho.

[palme.jpg]
Palmeiras = Aerosmith
A banda tem enorme tempo de estrada.Mas suas músicas só atingem o estrelato quando faz alguma parceria.


[sp.jpg]
São Paulo = Queen

Já foi eleita a melhor do mundo uma quantidade de vezes.E um dos seus integrantes é assumidamente homossexual
.

[santos.jpg]
Santos = Beatles
Nos anos 60, não tinha pra ninguém.Só que até hoje é lembrado no mundo inteiro pelos sucessos de 40 anos atrás.

[vasc.jpg]
Vasco = Oasis
Banda de qualidade e importância inquestionáveis.Todo mundo quer gostar dela quando ouve, mas a imagem do ex-líder faz muita gente ainda sentir aversão.

[inter.jpg]
Internacional = Led Zeppelin

Reinou nos anos 70 e morreu nos 80.Seus líderes conseguiram juntar os cacos e voltar nos anos 2000, com uma inesquecível turnê mundial.


[flu.jpg]
Fluminense = Titãs
Banda charmosa e simpática e, no Brasil, é querida por muitos.O problema é que ninguém nunca ouviu falar fora de nossas fronteiras.

[botafogo.jpg]
Botafogo = Rolling Stones
Seria o maior da década de 60, se não houvesse um rival mais popular.Teve seu Satisfaction em Garrincha. Há alguns anos retomou o rumo e está feliz da vida.
[cruzeiro.jpg]
Cruzeiro = Paralamas do Sucesso
Na América do Sul é respeitado e campeão de vendas.Mas quando participa de um festival com bandas européias é café com leite.

[fla.jpg]
Flamengo = Jorge Ben Jor
Há muito tempo não produz um grande sucesso.Mas é incrível como segue popular e nunca sai da moda.

[coritiba.jpg]
Coritiba = Banda Blitz & Ewandro Mesquita
Um raro sucesso nos anos 80, que os seus fãs ainda cantam nos dias atuais, por falta de outras músicas boas...

[ponte.jpg]
Ponte Preta & Guarani = Chitãozinho e Xororó
Quando apareceram, ganharam muitos fãs pelo Brasil, virou febre, mas nunca foi unanimidade. Depois de um tempo, e de tantas imitações, se relegaram aos seus poucos fãs do interior.


[goias.jpg]
Goiás = Leonardo

Tomou espaço de outros similares, e vez ou outra emplaca um sucesso, mas nunca chegando ao topo como seus inspiradores.


[amricaRJ.jpg]
América-RJ = Erasmo Carlos
Parceiro na panela Jovem (RJ) da década de 60, hoje em dia vive só de nome e de lembranças dos saudosistas e dos poucos fãs malucos que são diretores de TV.


[remo.jpg]
Remo = Calypso
Orgulho do Pará, e só do Pará.

[parana.jpg]
Paraná Clube = Los Hermanos
Seus poucos fãs juram que a banda é muito boa.Mas, fora eles, ninguém mais no mundo sabe que ela existe.


[atlparanaense.jpg]
Atlético Paranaense = Amy Winehouse
Já foi muito badalada e considerada a estrela mais promissora dos últimos tempos.Mas atualmente é boçal, desperta ódio em todos e está para morrer a qualquer momento.

Prazer, sou Cleverton Gomes

sexta-feira, 11 de março de 2011

O PERU DA VELHA MADAME ELVIRA - GENTE DE RONDÔNIA

           
          
Era dezembro, no apagar das luzes de 1960. A pequena Porto Velho, capital do então Território Federal de Rondônia, agitava-se com as presenças de seringalistas e seringueiros endinheirados, vindos de trem ou de barco de vários seringais localizados nos rios Abunã, Jacy Paraná, Candeias, Jamarí, Machado e cercanias. Na época, existiam apenas duas cidades em dois únicos municípios para uma área de mais de duzentos e quarenta mil quilômetros quadrados do progressista Território: Porto Velho, no quilômetro zero da Estrada de Ferro Madeira Mamoré,  servida pelo rio Madeira, e Guajará-Mirim, do outro, na outra ponta da linha, a trezentos e sessenta e seis quilômetro, pela linha férrea, ao Sul, separada da Bolívia pelo rio Mamoré.

Nesse ambiente de justificada euforia da eco0nomia portovelhense, era considerável o movimento registrado nos estabelecimentos comerciais dos mais variados ramos que se espremiam na 7 de Setembro, José de Alencar, Barão do Rio Branco, Prudente de Moraes, Henrique Dias, essas as principais ruas e avenidas da cidade e, também, por que não mencionar, nas ruas Pedro II e Afonso Pena, onde funcionavam os mais atrativos lupanares de Porto Velho, conhecidos apenas pelos nomes de suas inesquecíveis proprietárias, madame Maria Eunice, num ambiente mais refinado, e madame Elvira, este mais simples, mais modesto, mais autêntico como autêntica e inigualável era a figura de Elvira, cujo apelido de "tartaruga", "tatá" ou "tatinha" ela suportava algumas vezes, se proferidos por aquelas pessoas mais íntimas, em determinadas circunstâncias! Esses faziam dela "gato e sapato", como veremos mais adiante.
Morena clara, praticamente na terceira idade, carregando, com dificuldade, seus quase noventa quilos adquiridos, sem querer, no percorrer de uma existência vivida mais de sofrimento e maus tratos, do que de alegrias, em regiões inóspita desta Amazônia, Elvira Santos, uma solteirona de quatro costados, tinha como marca inconfundível singulares características de personalidade. Autoritária, profunda conhecedora de seu ofício e com uma franqueza permanentemente de plantão na ponta da língua solta, pronta para cuspir fortes emoções, ela, graças a esse atributos, acabou conquistando merecido destaque entre as figuras folclóricas da cidade. Como contrapartida, possuía um espírito humanitário filantropo, acobertando um coração sensível, grande, fora do comum, fazendo dela, inclusive, a mãe, a avó, a protetora de "filhas" e "netos" vários - por ela tratados com desvelo, apesar de com esses não ter qualquer li8ame de consangüinidade.
Com uma população estimada em torno de quarenta mil habitantes, sérios problemas de abastecimento de água e luz (o fornecimento de energia elétrica era inconstante durante o período diurno), e à noite quase toda a cidade mergulhava em completa escuridão, geralmente, a partir das vinte e três horas), a pequena Porto Velho seria um verdadeiro inferno para seus visitantes, para os boêmios, para os solitários, românticos de todas as idades, não fosse à existência de dois ou três cinemas, alguns bares com geradores de energia próprios, biroscas e principalmente, as famosas boates como essa de madame Elvira, que dispunha de serviços de bar e onde se podiam ouvir as últimas gravações de Orlando Silva, Nelson Gonçalves e Silvio Caldas e, até, se quisesse, dançar e passar a noite em boa companhia em um dos vários pequenos quarto de madeira, construídos, uns ao lado dos outros, nos fundos da boate plantada na Rua Afonso Pena, esquina com a Marechal Deodoro.
Portanto, beber uma boa cerveja gelada na intimidade de madame Elvira ou em companhia de uma mulher loura (coisa rara e atraente naquela época) era, pois os principais motivos da insólita preferência de uma seleta clientela composta de membros da poderosa classe dos seringalistas, da classe média, de dignitários do governo territorial, do ministério público, da municipalidade, da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré e de abastados comerciantes, inclusive autoridades civis, militares e... Bem, seria exagero acrescentarmos "e o povo em geral", por uma razão muito simples: as pessoas com menor poder aquisitivo preferiam mesmo marcar presença em outros "estabelecimentos" similares, não menos famosos, todavia, como das madames Delícia, Anita, Mãe Preta, o Tambaqui de Ouro e outros.
Em seu domínio territorial, e mesmo fora dele, Elvira costuma tratar a todos pelo primeiro nome, omitindo costumeiramente qualquer título distintivo. Essa intimidade era tamanha que nesse de 1960 ela, que era exímia cozinheira, tangida por desejos de confraternizar-se com alguns desses amigos e fregueses mais pródigos, considerando os bons resultados financeiros auferidos, resolveu fazer-lhe uma homenagem especial durante a ceia de Natal que anualmente costumava realizar apenas em companhia das "meninas", suas hóspedes de "casa", comida e roupa lavada ““! Sabendo não ser possível convidar a todos, mesmo porque não haveria espaço suficiente no salão, dizem que Elvira, alguns dias antes daquela grande data, montada em sua poltrona de cipó titica onde costumava se instalar confortavelmente, com a perna direita em posição elevada para minorar as dores provocadas por uma velha e inseparável erisipela, convocou Jiló para uma tarefa importante, confidenciando-lhe com voz e autoridade maternal (Jiló era a "lugar tenente" de Elvira, fiel amiga que a "acompanhava" desde moçoila, quando  "dera com os burros n'agua").
- ”Escuta aqui Jiló”. No sábado que vem é dia vinte e quatro, véspera de Natal. Faltando uns três dias, você e as meninas, desde agora, podem espalhar a notícia de que na véspera de Natal a boate não vai funcionar... mas que ninguém de fora fique sabendo, por enquanto, da nossa ceia e dos convidados, ta certo?   
             - “Sim senhora, madame Elvira”.... (Elvira continuou)
             - “Escute mais:  no dia, eu vou assar o peru nesse fogão novo que ainda não foi usado (fogão a querosene, uma novidade na época) e me mande o boliviano colocar ele aqui mesmo no canto do salão (Boliviano era um rapaz nascido no país irmão, de nome Alberto, que realizava aqueles serviços mais  “ pesados “nas boates das madames Elvira e Maria Eunice”.). No dia, pegue essa mesa grande (apontado) e emende com mais umas três ou quatro, aqui no meio, p'ra caber todo mundo - Tome as providências porque eu quero ver aqui, exatamente meia noite, dessa vez, junto com a gente, o Ovídio, o Sebastião Tenente, o Stélio, o Câmara, o Antônio "Cruzeta", o irmão dele "Canelinha", o Colares, o Durval - se a mulher dele estiver viajando, o Rafa, o Paivinha, o Ormarzinho e o Chico Reis - que só andam juntos... e o Marçal, se ainda estiverem na cidade. Chame só esses, que eu não quero muita confusão aqui ““!
          - “Sim senhora, madame”... “respondeu Jiló, humildemente”.
          Como em ambiente de puteiro, entre as mulheres, não há segredos, logo no dia seguinte, os propósitos da Tartaruga com todos os detalhes possíveis, inclusive da especial presença de um peru recheado no centro da mesa, foram totalmente revelados imaginem para quem? -  Jacinto Pimentel, habituê do recinto, inclusive durante horários imprevistos, que fingiu não sentir-se injustiçado ao saber que seu nome não figurava na famosa nominata da madame, cochichada em seus ouvidos durante uma sessão de cama ocorrida na tarde chuvosa de uma quinta-feira! Logo mais, depois das oito da noite, no bar do Benedito - na av. 7 de setembro, Jacinto, sorrindo e recomendando reservas, retransmitia a notícia para aqueles que, como ele, era considerado pessoas íntimas da madame Elvira.
          O bar de Benedito de Souza Brito (simpático, bonachão, corpulento, arrastando aqueles chinelos), era o local em Porto Velho onde a cerveja era, realmente, servida gelada com véu de noiva, isto é, com uma tênue vestimenta branca de gelo, na garrafa. Naquela noite, um grupo especial de seus amigos e fregueses habituais estavam ali reunidos, como sempre, para trocar idéias de interesse comum. E, evidentemente, falar da vida alheia: Abel Marques, Hortêncio Simplício da Silva (Brutus), Francisco Braga de Paiva (Capitão Maravalha), Boanerges Lima (Borneco), Júlio Pantoja (Julico), Walmar Meira Paes Barreto (Caiapó), Durval Gadelha (Durval), Renato Peres, Henrique Pulling, Theodoro Feitosa (Dorinha) e Francisco Barreto, todos com cadeira cativa no coração no recinto e no "livro" de contas-correntes do Bené: um borrador, feito com papéis recortados de embalagens de pacotes de cigarros, presos por uma velha e enferrujada garra de metal com o formato de uma mão, por ele calma e cuidadosamente manuseado (prática aprendida outrora, em seu seringal) durante freqüentes lançamentos nas colunas de débito e crédito, alias, mais de débitos do que de créditos!
          -"Essa não! Tão vendo só aquela escrota não convida a gente? Disse Hortêncio demonstrando falsa indignação, justamente para provocar discussão acirrada entre os presentes, como era seu costume fazer".
          - “Rapaz, deixa isso p’ra lá, disse Durval com voz baixa, pausada, conciliatória, com a cabeça inclinada e aqueles olhos arregalados pregados no chão”! Sempre recatado e, por dever de ofício, ferrenho defensor da justiça e do direito, Durval recomendou que admitissem que era um direito da Tatinha convidar a quem ela quisesse...
          - "Tu fala assim porque teu nome ta na relação" - interrompeu Julico, em tom de ironia...
          - "Já sei", atalhou Brutus após cochichar com Abel “nós vamos roubar aquele peru e vamos comer ele com uísque e cerveja lá na casa do Walmar”... ta certo, Caiapó?
          - "Êpa, essa não!" - gritou Walmar. "Na minha casa, não. Façam a sacanagem de vocês noutro lugar, onde quiserem, e não contem comigo nessa empreitada. Vocês sabem que eu topo qualquer parada; gosto de peru, de carneiro e especialmente de uma boa tartaruga... porra, mas o peru da velha Elvira. Peru de Natal. Esse não! Vamos falar de outra coisa?"
          - "To com Hortêncio e não abro", interrompeu Jacinto, apoiado por Abel, Henrique e Capitão (note-se que este último estava na relação da Elvira, contudo decidira por antecipar-se aos demais).
          - "Nós vamos todos  no carro só e eu quero ser o motorista arrematou Barreto. Faz um bocado de tempo que eu não como esse tipo de comida!" - (Barreto, filósofo e amigo de todos, era funcionário público, lotado da Divisão de Saúde, na função de motorista).
          - "Ei, Bené, arreia, mas duas aqui pra nós!" anunciou Hortêncio, já com um charuto aceso no canto da boca e cuspindo de quando em vez.
          Virando-se para a equipe de voluntários já formada, Hotêncio concluiu, demonstrando aquela competência tantas vezes posta à prova em matéria de roubo de carneiro, graças à qual conquistou "fama e prestígio" nos meios sociais da proviciana e pacata Porto Velho...
          - "Olha aqui, pessoal: a partir de amanhã, todos aqui de novo p'ra gente ir trocando idéias de como vamos arrancar o bicho de lá!, Jacinto vosmicê não me falte! Eu acho que você vai ser a peça mais importante dessa empreitada".
          Enquanto os dias se passavam, cada vez mais a notícia se espalhava entre os membros daquele grupo de amigos cujo prestígio pessoal e social (e político) marcou época na vida do Território Federal de Rondônia. Quem não estava presente no bar do Bené, quando e onde o segredo foi revelado por Jacinto Pimentel, ficou sabendo do boato, inclusive de que Abdon Bichara (também amigo de Elvira) e representante dos serviços Aéreos Cruzeiro do Sul em Porto Velho, mandara vir de São Paulo, de avião, um peru gigante, vivo, para atender aos desejos da amiga! A curiosidade era tamanha, que a partir de então, o movimento da boate aumentou mais ainda, inclusive em horários vespertinos, quando seria possível, disfarçadamente, passar os olhos no quintal da Tartaruga, repleto de goiabeiras: os poleiros prediletos daquelas galinhas enormes de raça indiana.
           Finalmente chegara o sábado, dia 24, e Jacinto já tinham na memória todo um relatório verbal baseado no qual, à tardinha, no bar do Mané, a turma iria traçar um plano definitivo de ataque para ser cumprido nos mínimos detalhes. O sino da igreja matriz ainda não tinha badalado seis horas da tarde quando Hortêncio, mentor e estrategista, "riscou" em frente ao bar do Bené, em seu jipe dirigido pelo experiente Barreto. Pegou ele mesmo uma das mesas e colocou na calçada, em frente ao bar, auxiliado pelo amigo que conduziu as cadeiras.
          - “Ohhh, Bené, traz uma daquelas...”.
          Nem mesmo acabara de falar, Benedito já estava ao seu lado com uma garrafa já aberta e mais dois copos entre os dedos de uma daquelas mãos enormes.
          -"Será que vai chover hoje?" - brincou Bené, numa forma diferente de perguntar sobre o motivo da presença inesperada daquelas duas figuras, tão cedo, em seu bar.
          - “É”... Nós estamos esperando a turma porque hoje a gente que ir p'ra Missa do Galo... - Porra, Bené, que diabo de curiosidade é essa..
         Não tinha jeito não, Benedito conhecia profundamente a personalidade daqueles seus fregueses especiais, além de estar sempre bem informado sobre tudo o que acontecia na cidade. Pela entonação da voz, pelo modo de olhar enquanto estivesse falando, ele sabia quando o amigo estava mentindo ou querendo aplicar-lhe um "blefe"!  Bené rodou nos calcanhares e sorrindo entredentes, vaticinou:
          - “Eu acho que vocês vão roubar o carneiro que o Júlio Pantoja recebeu ontem do seringal, p’ra matar no dia do casamento da filha”! - Bené sabia de tudo. De tudo?
          Mais adiante ele parou e deu uma risada - "“ Já sei, hoje é sábado, véspera de Natal, o dia do peru!...”Disse, batendo com a mão na testa, como para reprimir o esquecimento”.
          Hortêncio disse imediatamente para Barreto:
          - "Anota ai, nego velho, essa notícia do carneiro do Julico!”.
          Lá pelas sete e meia, a corriola estava completa e nesse momento, o relator Jacinto estava com a palavra! “Jacinto era co-proprietário de uma padaria muito movimentada situada no mesmo lado da Avenida 7 de Setembro, onde, a dez metros, uma placa anunciava: Bar São Benedito, de Benedito de Souza Brito & Cia.ltda.”. Dizia ele:
         - "Hoje, pela manhã, quando eu mesmo fui levar os pães que a Jiló me encomendou, logo na esquina eu já fui sentindo um cheiro bom, de coisa assada.... Aquela parte do salão, que tem uma porta no rumo da cozinha foi toda transformada, tudinho, numa cozinha só... - “Eu queria que vocês vissem a Tatinha de camisolão, sem aqueles porta-seios”!" (Antigamente sutiã tinha outro nome. Especialmente nesse endereço, entre aqueles seios fartos, parecia haver um verdadeiro poço sem fundo, onde Tartaruga escondia dinheiro, lenço, chaves e uma porção de coisas mais) - “Ela estava com um pano amarrado na cabeça, dando ordens p’ra mulherada, cada uma fazendo um serviço diferente”... Todo mundo vestia à vontade.... Tinha até mulher de camisola... Eu vi, até, mulher sem calças!
          "Puxa vida, isso é que é trabalho de equipe" comentou Abel, proprietário da única máquina de "pelar arroz" da Capital, a Usina Santo Antônio.  Ei, Bené, arreia mais duas!  Continua "querido", vai.. (Abel tinha o costume de chamar todo mundo de "querido").
          - “E vocês pensam que é só peru que vai rolar hoje à noite”?  Olhem (apontando e segurando com a mão direita, seqüencialmente, cada um dos dedos da mão esquerda): - Tão fazendo um panelão de arroz, outro de vatapá, outro de farofa na manteiga... Duas galinhas grandes, daquelas de dormem naquela goiabeira, ao lado da casa, também morreram... Eram elas que estavam no forno, cheirando bom!... (após ligeira pausa) - Hoje eu vi a Tartaruga alegre!  Eu acho até que ela resolveu tomar um uisquinho, pois ela hoje está chamando nome feio mais do que nos outros dias.
          - "E daí, meu amigo, você não viu o peru?"  interrompeu Henrique, não apenas interessado no troféu, no prêmio por todos desejado, mas, principalmente, na repercussão que o roubo, o fato se consumado iria causar na cidade toda.
          - "Pêra aí, meu chapa, tenha calma", disse Jacinto, contendo o amigo.
          A essas alturas, já passava das dez da noite e o Benedito já havia contabilizado quase duas dúzias de garrafas de cerveja, arrumadas no chão, do lado de dentro do bar, ao lado de uma banda de porta, de longe controladas por ele.
          - "Vocês não vão querer mais um tira-gosto de queijo?"  interrogou Bené (queijo de coalho, duro e salgado, que era o principal tira-gosto servido naquele bar).
           - "Não”!”Respondeu Hotêncio, engolindo em seco um último pedaço de queijo”. Taí, nós que estamos desejando  comer coisa assada, que tal uma galinhazinha p'ra gente destrinçar aqui mesmo, em cima dessa mesa?"
            Ante a concordância de todos, ele falou para Benedito, com rara delicadeza:
            - "Bené, faz um favor aqui p'ra gente, cidadão?" (e agora com jeito brejeiro):
            - "Manda buscar uma galinha assada ai ao lado, no Antônio Galinha, p'ra nós?".
            Antônio era um nordestino muito branco, caladão, gordo e bonachão, proprietário de um pequeno restaurante, também vizinho de Benedito que, de tanto especializar-se em galinhas assadas, conquistara esse sobrenome descabido...
          - “Bem, eu vou mandar avisar ao compadre Antônio, mas vocês vão pagar diretamente a ele”. Já basta o fiado que vocês têm aqui... “disse, virando as costas, contrariado”.
           Benedito era assim mesmo. De vez em quando, não continha suas indignações. No entanto, essas "broncas" entravam por um dos ouvidos daquela "raça" e saiam pelo outro!
           Ante a insistência de todos, Jacinto resolveu prosseguir com o relatório:
           - “Hoje à tarde, por volta das três, eu voltei lá com a desculpa de que precisava das bandejas que eu tinha levado com os pães, pela manhã”. Tomei uma cerveja e ninguém me cobrou nada! Eu acho que aquele pessoal só ta pensando na ceia. Mas, meus irmãos (fazendo gestos largos) eu queria que vocês vissem o tamanho do peru que estava de molho dentro de uma bacia enorme! De vez em quando, Tatinha botava as mãos nele, com todo carinho, como se tivesse dando banho numa criança de peito. Eu queria que vocês vissem!.... Agora, já noitinha, antes de vir para cá, passei lá de novo e sei9 que o peru está dentro do forno, já assado, e só vai sai de lá, direto para o meio da mesa, quando os convidados chegarem e  todo mundo estiver em volta, com a Tatinha na cabeceira. Jiló me disse, em segredo, que ela foi encarregada por madame para dizer umas palavrinhas... Ela até já decorou! É mais ou menos assim:
                 “Nossos corações estão muito felizes porque”.
                   Vocês vieram festejar o Natal conosco.
                   Um feliz Natal para todos, em nome de nossa.
                   Querida e amada madame Elvira e do nosso
                   Também. Viva o Natal ““...

          - "ta tudo do jeito como eu estou pensando... Mas me dê licença que eu vou ali no banheiro".  disse Hortêncio levantando-se para, em seguida, sair apressado no rumo do interior do bar.
          Hortêncio, na intimidade, muitas vezes era agitado e de atitudes imprevistas. Invariavelmente, momentos antes de surrupiar um bem semovente de algum amigo, um carneiro, por exemplo, dava-lhe um "trololó" nas tripas, que o obrigava, imediatamente, a “fazer necessidades fisiológicas”. Mais uma particularidade daquela figura inesquecível: diferente de Hobin Hood, os animais por ele surrupiados eram comidos por ele e os amigos e, algumas vezes, até juntamente com as vítimas, sem que essas de nada soubessem. As célebres "caldeiradas" do Hortêncio somente perderam esse especial tempero de "coisa alheia", se não me engano, a partir do último dia de março de 1964.
            Com incrível habilidade de raciocínio, Brutus foi detalhando as ações para a realização do "assalto":
            ““. e vocês, Pimentel, que conhece a casa como ninguém, entra junto comigo e nós vamos pedir uma gelada. E tenho a certeza que a Tatinha vai mandar servir, p'ra se ver livre da gente. E nós não vamos insistir em ficar... Como a luz costuma apagar as onze e meia, mas eu até acho que hoje nós vamos ter luz a noite inteira nessas bandas, nós vamos chegar lá faltando uns dez minutos p'ras onze, porque os convidados só vão chegar, com certeza, perto da meia noite, que é o horário marcado para a ceia. O Capitão fica do lado de fora da porta de entrada, pertinho da chave geral da luz que fica naquela caixa pregada na parede, do lado direito de quem entra, mas de olho em nossos movimentos, - vocês sabem que elas lá têm por costume acender, cedo da noite, um dos dois petromax (lampiões à gás de querosene, muito utilizados na época) e deixá-lo com o fogo bem baixinho para somente, aumentar a claridade depois que a luz se apagar. - Pois bem, quando você,  Jacinto, estiver bem perto do forno, eu vou ficar perto do petromax e vou olhar no rumo da porta. Esse será o sinal para o Capitão desligar a chave geral, por uns instantes, até o momento em que você passar por ele, de saída, ta certo? (todos aprovaram) Durante a escuridão o peru tem que sair do forno direto para o jipe e eu vou chegar lá logo em seguida, combinado?" (todos concordaram de novo).
          "Tudo bem, e nós, onde vamos ficar?"
          Henrique, mais uma vez, levanta uma questão.
          "Porra, tu, o Querido e o Barreto vão ficar dentro do jipe, no escuro, logo abaixo da esquina, na ladeira, no rumo do centro da cidade... Aquela rua é uma escuridão só, tu não sabe disso?" interveio Brutus, já meio nervoso!
          Aquele era o seu jeito de habitual de falar.
           Respirando fundo, Brutus complementou já mais calmo:
           - “O motor do jipe tem que ficar o tempo todo ligado e, se parar e não pegar na partida, pega no tranco de ladeira abaixo, entendeu Barreto”?.
           - "Eu sei disso, querido. Não se meta onde eu sou doutô!.." disse, com aquela voz grossa e calma, coçando a cabeça em sinal de desagrado.
            - Agora sim, ta tudo bem explicado e direitinho!  Admitiu finalmente Henrique, acendendo um cigarro.
              Dito e feito: quando Hotêncio entrou no salão, em companhia de Jacinto, o ambiente ainda estava praticamente vazio. Estava bem arrumada e madame Elvira sentada naquela sua poltrona de cipó titica, (agora primorosamente forrada), com uma das pernas em cima de uma almofada sobre um tamborete e uma bruta cara de ressaca. Jiló circulava a mesa grande completamente repleta de quitutes junto com a guarnição da ceia, conferindo caprichosamente pequenos detalhes da total cobertura e proteção feita com toalhas, muito alvas, bordadas, para evitar as presenças de moscas e mosquitos noturnos.
         Hortêncio antecipou-se sorridente e brincalhão, enquanto Jacinto escorregava pela direita... Percebendo o semblante da Elvira, ele logo admitiu que não deveria chamá-la pelo apelido indelicado:
          - “Oi, madame Elvira... Eu estou vendo que você, hoje está mais bonita do que nos outros dias...”.
           - “Que tu quer seu escroto”!... respondeu Elvira, fingindo-se zangada.
           - “Oh minha querida, não se apoquente!... será que eu não mereço nem uma cervejinha? Eu estava ali no Bené, junto com o Jacinto, tomando umas e outras e... me lembrei de você” – (agora olhando em torno de si com os braços abertos) “mas”... E cadê as meninas..
          - “Escuta aqui, esse macho aí, que veio contigo, não te disse que a casa hoje não está aberta para o público”?  ““ Hoje, meu amigo, nós vamos fazer uma ceia aqui, íntima (falando de maneira acentuada), e as meninas estão todas ainda nos quartos, se preparando”....
          - “Eu logo vi... (aproximando-se da mesa grande) – Essa mesa está uma beleza... Que é que tem aí por baixo desse lindo pano?” (e foi tentando levantar uma ponta da toalha).
          - “Êpa, êpa, não mexa em nada ai – disse Elvira, agora com energia”.
           - “Ta bom, ta bom... (e foi se afastando, na direção do lampião). Então manda servir uma gelada p’ra gente ir embora”.
           Tartaruga atendeu rapidamente:
            - “Oh Jiló, dá uma cerveja ai p’ra esse chato”... To vendo que ele já está é de cara cheia.
            Jiló prontamente atendeu, trazendo uma cerveja para os dois amigos. Hortêncio, enquanto bebia, posicionou-se mais perto do petromax e Jacinto, no seu lugar, conforme combinado.
             Tudo aconteceu numa seqüência de ações com uma precisão absolutamente fantástica. No momento em que a chave de luz foi desligada, tudo ficou às escuras, com exceção, naturalmente, do salão onde eles estavam devido a uma tênue luz do lampião, pendurado numa travessa. Nesse momento Hortêncio, rapidamente colocou o copo sobre uma mesa e agarrando o lampião, afrouxou rapidamente o parafuso da pressão... A pequena claridade existente foi sumindo e ele, naquele momento gritou:
            - “Querosene – Ta faltando gás” – enquanto dava um pequeno sopro no que restava de fogo, ficando tudo no escuro...
             Enquanto Brutus fingia tentar consertar o lampião, acendendo e apagando, de vez em quando um isqueiro que portava na mão, a luz voltou!..
             Graças a Deus, festejou Elvira com um largo sorriso nos lábios.
          Até aquele momento, ninguém percebera a ausência de Jacinto, que já estava no jipe juntamente com Paiva, os demais amigos, peru, bandeja e tudo!..
          Hortêncio, apressado, desculpou-se:
          - “Eu fiz o possível”... – Felizmente a luz voltou. Bem pessoal, eu já vou indo... Feliz Natal para vocês!...
          - “Feliz Natal, Hortêncio... Vá com Deus, a Pomba do Divino... e os ovos do Espírito Santo!” recomendou Elvira, enquanto sorria, com as mãos postas para o alto, como se estivesse agradecendo a uma entidade invisível, uma graça alcançada.
          O jipe já estava em movimento quando Hortêncio entrou ofegante, inquieto, pela porta da direita, empurrando Henrique (menor de todos), contra o motorista Barreto.
          - “Puxa vida, você demorou, hein?” reclamou Henrique...
           - Vamos embora, rápido Barretinho, que a bomba daqui a pouco vai explodir, anunciou Hortêncio em meio a uma gargalhada geral dos amigos, aos solavancos do jipe e ao leve calor irradiado por aquele belo e apetitoso troféu que, balançando também, parecia estar vivo, querendo saltar daquela bandeja prateada que Jacinto segurava, com firmeza, por sobre as pernas.
           Barreto desceu a rua Afonso Pena, dobrou logo adiante. À esquerda pela Tenreiro Aranha e, em seguida, dobrou a direita pela av. 7 de setembro, indo parar na esquina da av. Farquar, ao lado da Usina de Luz. Desligou o motor e perguntou de modo calmo e enfático:
          - “Afinal, onde nós vamos comer esse bicho”?
           Silêncio geral. Todos tinham a certeza de que Elvira, revoltada iria, certamente, pelo menos, passar em frente à casa de cada um dos membros da famosa curriola, orientada por qualquer motorista de praça dos bons, como Abias Paiva, por exemplo, que conhecia, como ninguém, onde todos moravam ou se escondiam.
            Abel quebrou o silêncio, advertindo:
             - “Meus amigos, nós temos que encontrar um lugar, sem demora”... A Tartaruga vai rodar a cidade toda procurando a gente, tem que ser um lugar que tenha luz, se possível cerveja gelada e um mínimo de segurança, inclusive local p’ra esconder o jipe. Não adianta a gente sair da cidade, para um sítio ou outro local qualquer, que não tenha essas condições. Afinal, hoje é dia de Natal e nós precisamos festejar a data condignamente, vocês não acham?
              - “Então, para onde nós vamos”? Novamente intercedeu Henrique.
              - “Não sei ainda Barreto”,
              Barreto com aquela calma de sempre, surpreendeu a todos:
              - “Más eu sei!”.
              - “Onde”? (todos gritaram a uma só voz)
              - “Então vamos ali!”
              Barreto não disse mais qualquer palavra. Manobrou o jipe e subiu a av. Farquar, entrou pela av. Pinheiro Machado, depois pela José de Alencar, parou e buzinou em frente a um certo portão da padaria do João Nobre, um seringalista simpático, filantropo, sempre sorridente e amigo íntimo de quase todo o pessoal da curriola. Quando o portão foi aberto e o jipe entrou, aconteceu um fato tão surpreendente que causou perplexidade aos “ladrões” (a exceção do Barreto). Não sabiam se era melhor rir ou lamentar-se!
          Dorinha Boanerges. Walmar, Júlio Pantoja, Rafael Vaz e Silva e José Moreira Couto (o Moreirinha, sempre vermelho que nem pimentão), Renato Peres, esses quase todos dissidentes das reuniões preparativas para o espetacular assalto, sorrindo e constituindo uma alegre “comissão de recepção”, cada qual com um copo na mão (inclusive João Nobre), cantando parabéns p’ra você” (idéia do Moreira), ao som de um violão tocado com maestria por Jorge Andrade, um seresteiro nato. Certamente os parabéns era para o peru, cuja presença involuntária, eles admitiam como certa, em face da indubitável confiança que esses heróis (os recém-chegados) sempre mereceram, mercê de sua experiência, competência e coragem, tantas vezes de4monstradas e pelos laços de imorredoura e verdadeira amizade que nos unem e muito nos honram” palavras essas, ditas em tom de discurso, por Boanerges, com o copo vazio em uma das mãos e os olhos já marejados de lágrimas!..
          Aquilo foi o máximo. Todos bateram palmas e se abraçaram, uns até chorando, felizes, como se esse ato de confraternização fosse, intencionalmente, aquele que faz a cristandade, na mesma hora, exatamente à meia-noite, na passagem do dia vinte e quatro para o dia vinte e cinco de dezembro...
          Enquanto o peru assumia um novo posto de destaque, numa mesinha de centro, entre convivas, antes de ser, por eles, devorado, a curiosidade dos membros da “comissão de recepção” tornava-se insuportável...Todos queriam saber detalhes sobre a vitoriosa campanha tão bem liderada por Hortêncio, o mentor, o estrategista vencedor e seus competentes discípulos.
          Capitão (Paiva) Maravalha foi quem falou, em nome dos recém-chegados, com gesticulação eloqüente e aquele seu linguajar simples, sem rodeios.
          - “Meus amigos – já viu? Eu já sou um pouco acostumado com isso. Brutus sabe muito bem... Eu só tenho a dizer é que a coisa foi muito rápida e tudo saiu como o planejado. Parabéns para nós todos que estamos aqui numa boa e vamos comer e beber até o dia amanhecer!... E a Tatinha, joviu, a gente consola ela depois. Mas me digam uma coisa: vocês sabiam que a gente vinha aqui p’ra casa do Nobrinha?”
          Dorinha foi que respondeu:
          - “Nós não somente sabíamos, como tínhamos a certeza de que o peru vinha p’ra cá junto com vocês, ou vocês não sabem que nós conhecemos o Hortêncio, e essa raça toda”? Sabíamos também que vocês não teriam onde se esconder, porque também conhecemos a Tatinha e sabemos do que ela é capaz. Por isso, combinamos com o Barreto e ele foi um cara “pai-dégua”! Soube guardar o segredo... Toque aqui Barreto, vamos brindar, disse, estendendo o braço com o copo na mão, em direção ao amigo, ao que foi correspondido, imediatamente, com o mesmo gesto.
          Coincidentemente, naquele momento, os sinos da Catedral começaram a badalar festivamente, anunciando o Natal para toda a cidade de Porto Velho, levando alegria aos corações de seus habitantes, lembrando-lhes que aquele era um momento de introspecção, de auto-análise, de confraternização e de conscientização no sentido do estabelecimento de propósitos pessoais calcados por uma vida sempre pautada na prática do bem, da virtude e do amor ao próximo.
          Infelizmente, no momento instante, na boate da madame Elvira, o cenário era completamente diferente, inverso, de desolação, de desespero, de faniquitos, tendo sido até registrados dois casos sintomáticos de histerismo. Mesmo o anúncio de Natal, feito pelos sinos da igreja, ouviu-se, abafado que foi, pelo choro, pelas lamentações, e pelos impropérios proferidos pelas “meninas”, aos gritos, ouvidos claramente em qualquer parte daquele famoso quarteirão suburbano!....
          Alguns minutos antes, quando o velho relógio de pêndulo, postados na parede, próximo à entrada da alcova de madame Elvira, marcava onze e meia, surgira à figura do primeiro convidado: o Tenente, sempre corado, barba escanhoada, metido num terno de linho branco, gravata borboleta, gestos esmerados nos cumprimentos formais, inclusive quando, insistentemente, enxugava o suor da face com aquele inseparável lenço branco, instante em que, concomitantemente, ofuscava a todos com aqueles quatro quilates de diamante cravado no anelar de sua mão direita! Em seguida, entrou Ovídio, chamando a todos de “meu mano”, segurando uma inseparável piteira preta com destaque dourados! Cruzeta e Canelinha chegaram no mesmo instante, montando veículos de última geração. Os últimos, chegaram em bloco liderados por Colares sempre falando em voz alta, como de costume.
          Mesmo sem a presença dos demais inscritos na famosa nominata de Elvira, o salão estava literalmente repleto de convivas e de “gente da casa”, as meninas, todas, exibindo suas curvas, vestindo modelos provocantes, para deleite de uma pequena platéia, íntima, privilegiada!.. O vozeio o era uma constante no ambiente, em meio ao som de uma gravação de Carmem Costa, cuja letra era recitada com os gestos brejeiros de provocações...

                         “Ele é casado e”.
                          Eu sou a outra
                          Na vida dele!... 

           Elvira estava sensacional, uma verdadeira rainha entre seus súditos... Com a maquiagem retocada, mostrando ligeira sombra sobre aqueles olhos grandes e dentro de um vasto vestido azul brilhante, ela se destacava entre todas as pessoas presentes. Desalojada de sua poltrona de cipó titica (nessa ocasião toda forrada de tecido branco e decorada com almofada escarlates), agora cumprimentava formalmente, a cada um daqueles amigos considerados sustentáculos de seu modesto e exitoso ramo de negócio.
          A grande mesa estava então descoberta, mostrando quitutes os mais variados: frutas da estação e outras importadas de São Paulo, de avião, pela Cruzeiro do Sul, como figos, nozes, uvas passas, castanhas, todo o conjunto bem distribuído, orlado de pratos, talhares, taças, garrafas de vinho e de champanhe, tendo ao centro um pequeno tripé de madeira apenas decorado com papel crepom, em nível propositadamente elevado onde, justamente, seria colocada a travessa prateada contendo o peru de Natal: o prato mais importante e desejado daquela ceia, resultado de um trabalho realizado com esmero por aquela de todos reconhecida como uma das melhores cozinheiras de Porto Velho: madame Elvira!...
          Um discreto olhar e um leve movimento com a cabeça, foi o sinal para que houvesse silêncio no recinto afim de que Jiló, intérprete oficial da anfitriã, cumprisse as breves formalidades ritualísticas programadas, que se iniciavam com uma ligeira peroração (exaustivamente ensaiada) e culminavam com a introdução do peru natalino, triunfante, em sua bandeja de prata!..
          Refazendo-se, ainda, da emoção sentida após receber estrondosa e merecida salva de palmas, Jiló, com um leve sorriso disfarçando a timidez, dirigiu-se calmamente em direção ao lindo fogão novo, postado ali bem adiante, no mesmo salão, seguida pelos olhares curiosos e de expectativa dos convivas, agora de pé e já preparados para nova manifestação de aplausos.
           Jiló abriu o forno e, imediatamente, um grito de terror saiu de sua garganta: “Ai, madame Elvira, pelo amor de Deus! Que desgraça, meu Deus do céu! O peru não está mais aqui!”..
           A poltrona de cipó titica lançada para trás, com incrível energia.
            Ninguém, ainda hoje, sabe explica o que realmente aconteceu naquele instante. Dizem que no lugar daquela mulher corpulenta, de saúde fragilizada, parecia estar agora uma criatura vinda de outra dimensão: hercúlea, ágil, colérica, respiração ofegante com os cabelos revoltos e os olhos congestionados olhando, agora fixos para um certo tripé de madeira abandonado no centro da mesa....
           Respirando fundo e elevando os punhos cerrados, Elvira gritou a plenos pulmões:
           - “F I L H A  D A   P U T A!....Aqueles filhos da puta roubaram o meu peru”
           A partir desse instante, ninguém entendia mais ninguém ....Algumas mulheres choravam, outras gritavam palavrões, outras esperneavam pelo chão, contidas pelos convidados estupefatos...
           Elvira entrou rapidamente em sua alcova e, segundo depois dela saiu, ligeira que nem uma flecha, com um bruto revolver metido no porta-seios, com o cabo à mostra, em direção à rua, de onde pegou um jipe de praça e sumiu no mundo acaçá dos “ladrões”!
           No carnaval de 1961, o Bloco da Cobra, o tradicional bloco da curriola, fez uma de suas melhores apresentações nas principais ruas da cidade. Em frente ao palanque das autoridades, o bloco evoluiu, com aquela elegância que lhe era muito peculiar, cantando a nova marcha-enredo do ano, composto com umas quadrinhas “de pé quebrado”, que até hoje permanecem na memória de muitos que viveram em Porto Velho naqueles bons e velhos tempos que não voltam mais...
                     Roubaram o peru da velha Elvira na noite de Natal
                     Mulheres e convivas choravam
                     E a fome foi geral
                     E dizem até que o peru era um colosso
                     Por isso mesmo tiveram raiva
                     Quando encontraram o osso dentro do bolso do Paiva.......


(Esse texto é dedicado a todas as personagens verídicas e, em memórias, de alguns que já partiram, em especial a saudosa Senhora madame Elvira).  
Fonte: Gente de Rondônia, Personagens da Nossa História .(Sérgio Ricardo Vieira Gonçalves)
 

sábado, 26 de fevereiro de 2011

TALVEZ -"No fim, tudo dá certo. Se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim"

            Talves, no decorrer de minha vida, as decepções me sejam companheiras inseparáveis. Mas jamais darei adeus às ilusões. Talvez não reunirei forças para realizar os meus planos. Mas jamais me condiderarei um derrotado. Talvez sofrerei injustiças. Mas jamais assumirei o papel de vitima. Talvez enfrentarei alguns inimigos gratuitos. Mas esses desafetos não me farão falta. A ausência deles até me preencherá uma lacuna.
Talvez as concorrências desleais me atropelem o ideal no meio do meu caminho. Mas preferirei descer traido a subir traindo. Talvez perceberei que cometi graves erros. Mas a minha consciência me dirá que errei com a vontade de acertar. Talvez mais adiante, perderei velhos amigos. Mas a sabedoria das Nações me convecerá de que aqueles que deixaram de ser amigos nunca os foram.
            Talvez o meu sonho de gloria se desmanche no chão - e eu me recolha à minha insignificância. Mas pouco importará. A grandeza do tudo acaba na pequenez do nada. Talvez censurem a minha sensibilidade poética. Mas não se ignorará que os poetas pensaram o mundo. Talvez eu não encontre motivos para maiúsculas comemorações. Mas não deixarei de me alegrar com minúscula conquistas. Talvez me bata o desejo de fugir à luta pelo bem comum. Mas não o farei. Será meu e morrerá comigo o ridículo anseio de ser útil.
             Talvez eu não seja exatamente que eu gostaria de ser. Mas passarei a admirar quem eu sou. Por quê? Porque, na etapa madura da minha existência, saberei que, apesar das minhas incontáveis dúvidas, sou capaz de construir, para mim e para os outros, um destino feliz. A tal respeito, já falou alguém: "No fim, tudo dá certo. Se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim". E nesta esteira, não haverá nenhum "talvez" e sim a convicção de que a minha vida valeu a pena e eu fiz o melhor que podia fazer.
       
(Berilo Pesconi) Folha de S.Paulo